Por ocasião do Dia Estadual do Ministério Público Maranhense, passado no último 15 de maio, muito há o que se comemorar.
“NÃO SE DEITE O SOL SEM QUE A JUSTIÇA
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
SEJA FEITA A TODO CIDADÃO
EIS O NOSSO DEVER IRRENUNCIÁVEL
SER FISCAIS DA LEI, NOSSA MISSÃO
PELO DIREITO, PELA IGUALDADE
SALVE O MINISTÉRIO PÚBLICO DO MARANHÃO”
Com esses versos, na poesia estampada em nosso hino institucional, de autoria de Wescley Brito da Silva, saudamos a nossa Instituição.
Ao longo de toda a sua existência, o Ministério Público do Maranhão tem uma história marcada por um grande protagonismo e muitas por enfrentar inúmeras revoluções, que o fizeram se reinventar ao longo dos séculos.
No Império, o Ministério Público Timbira despontou de forma pioneira através de seu patrono, o promotor de justiça Celso Magalhães, que ainda hoje é um farol indicar a todos os seus membros e servidores, a direção em busca incessante da justiça e do bem comum.
Celso Magalhães, então promotor da capital, teve uma postura inédita e pioneira em todo o Brasil Império, numa época em que a grande praga da escravidão ainda era legalmente aceita, e com um protagonismo que nunca havia sido exercido por outro promotor de justiça, já que o cargo a época era de livre indicação e não contava com as prerrogativas atuais, em busca da justiça, denunciou a então Baronesa de Grajaú, esposa do futuro presidente da província do Maranhão, pela morte do escravo Inocêncio, à época dos fatos com oito anos de idade.
A postura dignificante do nosso colega antepassado, acabou por levar a dama da sociedade maranhense a julgamento pelo tribunal do júri, do qual restou absolvida, haja vista a aceitação social, à época, para fatos são repugnantes. Ainda assim a postura do nobre promotor ecoa até os nossos dias, sobretudo porque depois disso foi alvo de uma injusta perseguição pelo esposo da baronesa, que tão logo assumiu o cargo de Presidente da Província do Maranhão, teve por primeiro ato demitir, a bem do serviço público, o grande defensor da sociedade.
Tal fato o marcou tão negativamente, que levou a adoecer e posteriormente a uma morte precoce, ceifando não só um grande promotor de justiça, mas um dos maiores e promissores escritores de sua época.
As décadas passaram, e mais uma vez o Ministério Público do Maranhão teve que se reinventar, assumindo protagonismo a nível nacional, quando desvinculou o seu comando da chefia judicial do Poder Executivo Estadual. Tivemos a oportunidade de comemorar com grande garbo, há dois anos atrás, o marco histórico relevante, dos 50 anos em que o Ministério Público Estadual do Maranhão deixou de ser chefiado pelo Procurador Geral do Estado, episódio que inclusive marca o dia Estadual do Ministério Público, qual seja 15 de maio, pela vigência da Constituição do Estado, em 1967, que definiu o Procurador Geral de Justiça como chefe do Ministério Público. Essa autonomia inicial deu início a uma história de conquistas.
Até então, o Procurador Geral do Estado também era o chefe da instituição, o que causava inegáveis embaraços, sobretudo em relação à função de fiscal da lei, exercida pelo Ministério Público, conforme regras processuais vigentes a época. A partir daquele momento, o Ministério Público passou a ter um chefe distinto daquele, ainda que também fosse de livre nomeação pelo Governador do Estado, e não obrigatoriamente um membro da carreira, mas tínhamos um Procurador Geral de Justiça para comandar os destinos da instituição.
Mas o avanço seguinte não tardou, já que com a Constituição Federal de 1988, o Ministério Público do Maranhão novamente assumiu posição de destaque, não apenas por ter a primeira Procuradora-Geral de Justiça membro da carreira em todo o Brasil, mas também a primeira mulher a exercer tal dignificante função, qual seja, a nossa estimada e reverenciada procuradora de justiça aposentada Elimar Figueiredo Almeida e Silva, que com toda a capacidade e sabedoria que ele é peculiar, fez de maneira brilhante a transição do Ministério Público, nos ditames da Constituição cidadã, que praticamente o transformou no quarto poder que verificamos de forma incontestável atualmente.
Assim como em toda a sua história, também nos tempos atuais o Ministério Público do Maranhão teve que se reinventar, para se adaptar a essa grave crise mundial da Pandemia causada pelo novo coronavírus, Covid-19.
Desde o primeiro momento, o Ministério Público Timbira adotou as providências necessárias para resguardar a vida e a saúde do seus integrantes, mas sobretudo da população, mas o fez sem que essa mesma população, tão necessitada da firme atuação dos membros e servidores ministeriais, ficasse alijada desse amparo tão significativo importante para o cidadão comum.
Adotamos o Teletrabalho, mas longe de significar uma diminuição de nossa atuação funcional, tal fato representou um incremento inestimável e um esforço que ultrapassou os limites normais de horário de serviço, por parte de todos aqueles que compõem a família ministerial, que passaram a não ter mais horário e nem dia para trabalhar, independentemente de quais sejam, para atuar em favor do nosso povo. Assim, ultrapassamos todos os recordes de produtividade de movimentações processuais e atuações administrativas que levaram a instituição a não ter qualquer prejuízo no seu dia a dia.
Além disso, o Ministério Público do Maranhão protagonizou inúmeras ações que chegaram a ter destaque internacional, como por exemplo pedidos de providências ao Poder Judiciário, para impedir a realização de passeatas e outros atos que importassem em aglomerações, e diante do crescimento do número de casos da moléstia, e do aumento indiscriminado do contágio, devido à falta de isolamento social, de forma pioneira no Brasil, o Ministério Público obteve um provimento judicial, que foi acatado pelo Governo do Estado e pelas prefeituras da região metropolitana da Ilha de São Luís, determinando o popularmente conhecido como “Lockdown”, ou seja, enrijecimento das medidas sanitárias para isolamento e distanciamento social, fórmula reconhecida internacionalmente como a mais eficaz para evitar a disseminação da contaminação da moléstia.
Estudos demonstram que essas medidas já importaram no salvamento de milhares de vidas de maranhenses e brasileiros, já que em média, no mínimo mais de 60 vidas foram poupadas por dia, durante esse período mais rigoroso de isolamento social
Estamos nos encontrando nesse espaço virtual, nesse horizonte aberto, que aproxima as distâncias e leva a nossa voz mais longe e cada vez mais ativa no seio da sociedade.
Na última sexta feira aniversariou pela primeira vez, a Lei nº 11.023 de 16.05.19, que criou o Dia Estadual do Ministério Público, reconhecendo a autonomia conferida à nossa instituição.
Havíamos programado um Simpósio presencial, onde prestaríamos outras homenagens, iniciando pelo lançamento dos livros “história oral” e “50 discursos” da Procuradora de Justiça aposentada, ELIMAR FIGUEIREDO DE ALMEIDA SILVA”, primeira escolhida, em regime democrático, para a chefia da instituição e primeira mulher do Ministério Público no Brasil a ser nomeada Procuradora Geral de Justiça, após escolha de sua classe, sob a égide da Constituição de 1988, mas as contingências atuais nos impediram de realizar o evento presencial, mas contamos com as palestras brilhantes dos Ministros do STF, Ayres de Britto e Luiz Fux.
Relembrar nossos desafios e aplaudir quem os venceu, aprendendo com suas experiências é dever de uma instituição que caminha para o futuro, vive o presente, mas que nunca pode esquecer o seu passado. Aplaudir Dra. ELIMAR, que tanto fez, em um universo de desigualdade de gênero, é nossa honra e nossa obrigação.
A distância física não nos afastou de nossos deveres institucionais e sociais. A sociedade espera muito de nós. Precisa do Ministério Público da Carta de 1988, que zela pela democracia, pelos direitos e interesses sociais e individuais indisponíveis, que zela pelo Estado Democrático de Direito, pelo respeito e dignidade das vidas humanas e de suas instituições.
Não sobreviveremos sem democracia, sem diálogo! Não sobreviveremos com um Estado mínimo, com um Estado ausente, com um Estado que não preze as pessoas humanas, que não as priorize!
Precisamos do Estado Social, de direitos fundamentais, efetivados para todas e todos! Precisamos valorizar e fortalecer nosso SUS – Sistema Único de Saúde, e nosso SUAS – Sistema Único de Assistência Social! Precisamos fortalecer nossa cidadania, nossa educação e nossa consciência institucional, social e humana.
Atravessamos várias crises, mas nenhuma dessa magnitude, a impor nossas ações rápidas, a exigir cada vez mais nossa sensibilidade, nossa solidariedade, nossa humanidade e a grandeza de nossa instituição.
O máximo que podemos fazer e estamos fazendo ainda é pouco do muito que nossos deveres institucionais e fundamentais nos exigem, do muito que nosso perfil de Ministério Público da Constituição Federal nos impõe.
Indispensável parar a refletir sobre este grave momento, para reexaminar nossas atuações, para reelaborar nossas metas, para lutar pelas vidas que precisam e merecem viver: todas as vidas, independente de idade e de condição social.
Nosso grande Ferreira Gullar, em palavras conscientes e sentidas, disse que fez sua poesia “da matéria humilde e humilhada, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição à vida e só e justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que não tem voz.” Parafraseando o poeta, ressaltamos: não é justa a luta se ela não for por todas as pessoas, se ela não for inclusiva, se não for feita para quem está na invisibilidade social e sem voz.
Não há consciência, nem caminhos para vencer a injustiça social e a pandemia sem o conhecimento científico, sem a educação de qualidade, sem que seja reconhecida a essencialidade do direito à educação para todas e todos.
A pandemia expôs as nossas vulnerabilidades e, sobretudo, expôs o abismo social, discriminatório, deste país. No Maranhão, apesar do trabalho incansável de tantos profissionais de atividades essenciais e do trabalho hercúleo do Governo do Estado, que com o aumento acelerado da rede hospitalar, da aquisição de equipamentos, respiradores e tantas outras medidas, lutam para conter o contágio, ainda não conquistamos a vitória e o fim do distanciamento social. Choramos os nossos mortos, as vidas que se foram. Não queremos que outras se percam. De luto estamos e na luta permaneceremos.
Com o isolamento social e com máscaras nos protegemos e protegemos as outras pessoas. Com transparência e sem máscaras, sem falseamento da realidade, e com ações autênticas devemos respeitar a democracia, suas instituições e os valores republicanos tão necessários em dias atuais em que tempos difíceis se avizinham, tanto no plano econômico quanto no democrático.
Precisamos estar vigilantes para prevenir retrocessos, sobretudo aquelas que flertem com o autoritarismo, com a demagogia e totalitarismos. Mas, é também oportunidade de aprendizagem para que o desespero ceda lugar a serenidade e resiliência, para que a desesperança ceda espaço a esperança e aflição a novos tempos de harmonia, avanços e sobretudo fraternidade e solidariedade.
Devemos respeitar e proteger a biodiversidade, a natureza que nos acolhe. A ética é dever na gestão pública! Cuidar das vidas, lutar pela efetivação de direitos fundamentais é a nossa missão constitucional.
Que possamos ver as desigualdades, as violações de direitos e que estejamos sempre irresignados e indignados para repará-las! Que não hesitemos na busca da justiça social! Que o juramento que fizemos seja fortalecido a cada dia para honrar a nossa instituição e a missão valorosa que recebemos!
Na toada, imortalizada por Humberto de Maracanã, do Boi de Maracanã, que soa forte nos nossos corações, levantamos as vozes:
“Maranhão, meu tesouro, meu torrão!
A matraca e o pandeiro faz tremer o chão
Esta herança deixada por nossos avós
Hoje cultivada por nós, pra compor tua história MARANHÃO”
Vamos sempre em frente! Orgulho de ser MPMA!
(*Procurador-Geral de Justiça do Estado do Maranhão)