Os ataques de Olavo de Carvalho e de seus seguidores nas redes sociais aos parlamentares do Partido Social Liberal que viajaram à China a convite daquele país abriram uma crise no governo Bolsonaro. O bombardeio dos seguidores bolsonaristas – que, insuflados por Carvalho, acusaram a comitiva do PSL de querer “vender o Brasil para a China” e de serem “comunistas infiltrados na direita” – deixou os onze parlamentares do partido com o sentimento de terem sido atirados “na fogueira” para encobrir o que consideram um escândalo: o pedido do filho do presidente Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro, ao Supremo Tribunal Federal, para ter foro privilegiado no caso em que seu motorista e assessor na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, Fabrício Queiroz, é investigado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), de movimentar 1,2 milhão de reais de forma atípica.
“É muita coincidência que o ataque aos parlamentares do partido tenha ocorrido justamente no dia em que o Flávio tomou aquela decisão escandalosa de ir pedir ao ministro Luiz Fux que lhe desse foro privilegiado”, me disse o advogado Cleber Teixeira, integrante da comitiva e futuro chefe de gabinete do deputado eleito Alexandre Frota, também do PSL.
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O advogado afirmou que o clima entre os deputados da comitiva era de revolta e indignação. “Durante anos eles combateram o PT e a esquerda pelos crimes que cometeram”, disse Teixeira, por telefone, por volta das 5 horas da manhã em Pequim. “Foram todos eleitos com a bandeira da direita, todos defenderam Bolsonaro e agora são acusados dessa forma? Que absurdo é esse?” A indignação dos parlamentares era ainda maior pelo fato de filhos do presidente – o deputado Eduardo Bolsonaro, eleito por São Paulo, e o vereador Carlos Bolsonaro, do Rio de Janeiro – terem “debochado” da comitiva. Carlos chegou a postar uma montagem com a deputada eleita Carla Zambelli segurando uma bandeira chinesa. “Isso aqui não é brincadeira”, afirmou Teixeira, inflamado. “Essa gente está brincando com coisa séria. A China tem uma oferta de investimentos de em torno de 30 bilhões de reais em infraestrutura do Brasil, e essa direita chucra, seguidora de Olavo de Carvalho, fica falando essas irresponsabilidades na rede”, afirmou.
Em seguida, Teixeira fez um alerta para o risco deste tipo de comportamento atrapalhar o governo na votação de reformas. “Imagina se estes parlamentares decidirem não votar com o governo?”, questionou ele. “Porque os parlamentares votam nas propostas de um governo em que confiam. Eles foram eleitos com a bandeira da transparência e agora o Flávio não quer que o investiguem? Não é obstruindo uma investigação que ele vai provar sua inocência.” Lembrou ainda que tanto Bolsonaro quanto seus filhos foram críticos aos pedidos de foro privilegiado feitos por Aécio Neves e outros políticos, e que agora pedem o mesmo benefício. “Não estou dizendo que ele seja culpado. Pelo contrário. Mas quem não deve, não teme”.
Teixeira afirmou ainda que, se os parlamentares não se sentirem confortáveis com o comportamento do Executivo, podem não votar as reformas. “Eles não darão carta branca a um governo em que não confiam.” E foi além. Disse que o presidente Jair Bolsonaro deveria controlar os filhos dele. “Todos nós respeitamos o Jair, mas não vamos aceitar esses ataques dos filhos dele. Isso não é uma monarquia. Ele não é rei e os filhos dele não são filhos do rei.”
O advogado se mostrou indignado com Olavo de Carvalho. Disse que Bolsonaro deveria controlar também os ataques do guru da extrema direita aos parlamentares do PSL. “Quem vai garantir os votos que ele precisa no Congresso? Os deputados da sua base ou Olavo de Carvalho? O Fernando Henrique perdeu a reforma da Previdência [em 1998] por um voto. Quantos votos Bolsonaro tem aqui na China?”, perguntou. Afirmou que não se tratava de uma ameaça, mas sim da necessidade de o governo entrar na defesa de seus parlamentares. Desde o início da confusão, o presidente Jair Bolsonaro não se manifestou a favor da comitiva do PSL da China. Durante visita à embaixada do Brasil, em Pequim, os parlamentares decidiram deixar clara sua indignação com o caso. A senadora Soraya Thronicke, do Mato Grosso do Sul, ligou da embaixada para o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, que também vinha se mantendo em silêncio, e irritada, pediu que ele se posicionasse em defesa da comitiva. Ele não se manifestou oficialmente. O chanceler foi indicado para o cargo por Olavo de Carvalho, de quem é um fiel seguidor.
Na quinta-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já havia se encontrado com o embaixador da China para discutir investimentos do país asiático no Brasil. Na próxima semana, Bolsonaro viaja para o Fórum Mundial de Davos e está previsto um encontro com o presidente da China. “Quero ver se o Olavo de Carvalho vai chamar Bolsonaro de comunista”, disse Teixeira.
Fonte: Uol